Luciene Carris faz um prazeroso convite ao leitor com esse livro. Na melhor tradição dos cronistas, alguns dos quais estudados e citados aqui, somos guiados pelas ruas do bairro do Jardim Botânico e os vizinhos Gávea e Lagoa. A partir das ruas que transita, a autora vai nos contando a história do bairro, do que existiu e do que ainda existe, mesclando o trabalho da historiadora _ sem descuidar do rigor da escrita histórica no uso de vasta documentação e método de pesquisa_ com as suas próprias memórias e indagações que fez ainda criança… e que a adulta buscou responder e entender. Assim como o trajeto das ruas, Luciene escolhe caminhos nem sempre retos. Dobra esquinas, dá meia volta e parte às vezes de sua história individual para conduzir o leitor à história do bairro, da cidade e do país. E ainda, articula diversas dimensões do fazer histórico com o ato de sentar-se num boteco ou tomar café numa padaria.
Assim, prédios, ruas, instituições, acontecimentos, pontos do comércio local, favelas, fábricas, botecos, lugares e personagens, são mostrados nesse passeio, que nos apresenta, entre outros moradores ou visitantes do bairro, Machado de Assis e Tom Jobim; mostra as descrições exuberantes da Lagoa Rodrigo de Freitas, da Floresta da Tijuca, e do Imperial Jardim Botânico feitas por cientistas e pintores que chegaram ao Brasil Oitocentista e as chuvas que continuam a inundar o bairro; nos conta das lutas operárias de quando a região era um subúrbio fabril e as atuais ameaças de remoção ao Horto… personagens, eventos e lugares visitados no percurso e explicados pela autora com maestria. E é nesse percurso, que fazemos através das ruas e das décadas, que acompanhamos o processo de transformação da área em bairros de classe média. Novamente, a história individual, da autora que mora no Horto sob a ameaça de remoção, se junta à História Urbana, Social, Política, sem que a autora solte nossa mão, numa escrita leve e fluida, que nos faz ler o livro como quem de fato realiza um passeio profundo, por vezes até dramático, mas muito agradável pela cidade e sua história.
Mário Brum é professor de Teoria e Ensino de História do Departamento de História da UERJ.