Diplomata, escritor, tradutor, dramaturgo, Silvio Albuquerque se confirma, neste livro, como observador sensível e inquieto das pessoas, comuns ou célebres, que constituem nosso tempo. Buscou no geógrafo Milton Santos, outra maravilha da intelectualidade brasileira, inspiração conceitual para estruturar uma obra mais necessária hoje do que quando idealizada.
Em meio à descrença e ao desmonte das políticas de construção da igualdade mundo afora, o autor renova os votos — e nos exorta a fazer o mesmo — com a agenda ainda urgente de combate à discriminação, sobretudo, racial. Escolheu cirurgicamente episódios que escancaram as dimensões do racismo, quase sempre combinado a outras chagas: misoginia, xenofobia, aparofobia, intolerância religiosa, supremacismo.
No rol de indivíduos retratados, a certeza de que dinheiro, conquistas e fama não blindam ninguém — não raro, expõem. A apresentação não cronológica dos textos parece nos lembrar que as mazelas nos alcançam a qualquer momento; o curso da História não as detêm.
Os relatos de “Cidadanias mutiladas, dignidades restauradas” mostram que, se não existe antídoto contra o dolo, tampouco há interdição ao consertamento. A resistência é bem-vinda. Na arqueologia de Silvio Albuquerque, um apelo ao que resta de humanidade em nós.
Flávia Oliveira, jornalista.