Passaralho. Eis uma palavra assustadora, aterrorizante, horrenda. Remete a uma revoada de aves de rapina que deixa destruição por onde passa. Trata-se de um jargão agressivo para as demissões em massa nas redações dos meios de comunicação. É quando o jornalista deixa de ter o desemprego como objeto de observação, como tema de seu ofício, como elemento da reportagem que está produzindo para vive-lo por dentro. A jornalista Carolina Abelin sobreviveu a alguns passaralhos, a outros sucumbiu. Seu corajoso relato não é apenas uma reflexão sobre as agruras laborais de seus pares, diz respeito a um novo mundo do trabalho que atinge indistintamente a todas as profissões. Da baixa na velha carteira de capa azul criada por Getúlio Vargas à demissão digital pelo “épi”, qual o impacto da tecnologia na vida do trabalhador brasileiro? A precarização das relações trabalhistas, a cassação de direitos, a informalidade, a fetichização do empreendedorismo como virtude absoluta sem o amparo de uma política de bem-estar social realmente acolhedora. Todos esses temas são subjacentes ao ponto central tocado pela autora deste livro: de que valem a ocupação e o emprego descolados da condição humana, da ideia de que trabalhamos todos, solidariamente, para prover uma vida em comunidade? Na atual etapa do capitalismo, de clara hegemonia das finanças, há casos em que o trabalho humano pode ser simplesmente desnecessário. Por isso esse livro não é apenas sobre os milhões de brasileiros desempregados a que o título alude. É o sobre o que cada um de nós faz com nosso tempo, nossa energia, nossos sonhos.
Marcelo Canellas